Por que dói viver? Por que dói seguir em frente depois de tanto tempo seguindo junto? Será que não existe nenhum alívio para o peito de quem sofre tanto a dor de romper a ilusão do amor.
Eu queria pôr uma pá de terra sobre esse peito aberto, escancarado e deserto, para amaciar-me, eu que endureci na queda. Eu que caí de pé para sair correndo e estanquei. Minha fragilidade repentinamente expressa, vulnerável como a flor ao vento. Despetalei desentendida do que fui e do que serei.
Mas hoje, precisava, meu Deus, abrir os braços e aceitar de bom grado o final de tudo que se chama morte. A morte do amor que se transforma em outra coisa ainda. Do amor que, não podendo manter-se aceso, esvoaça de cinza bem vivida. O tempo que o tempo deu. Hoje eu precisava entender que nos braços da natureza viva estou mais protegida que se ofertada em oferenda no templo.
Não me basta saber que é vão, tudo vão, nesse mundo de passagem, onde um dia transcorre ao outro ininterruptamente, sem esperar, sem significado, sem precisão senão a precisão das marés. Não me alegra saber que não tem mais nada além, como os regatos que correm, correm, descendo sempre para um mar distante. Em que mar vou me derramar no meu caminho?
Quando um pássaro rouba meu pensamento num vôo flanado, eu vôo com ele no azul distante e de lá, olhando de volta para mim na terra perplexa, vejo em que me transformei, serpente esfolada e pisoteada que quis negar sua natureza de peçonha, não me tornei uma pomba da paz, não me tornei em cordeiro, apenas um bicho selvagem não domesticado esquecido de sua ferocidade adormecida. Apenas a insubmissa pedra rolando no riacho transparente, uma fantasia devota e infiel.
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