O que
procuro num relacionamento é que ele seja um lugar maior do que o meu lugar
sozinha. Que ele amplie meu universo, que traga novas perspectivas, um novo
olhar para o meu cotidiano. E se não trouxer, que permita. Que seja um espaço
de trocas, de aberturas, de aceitação. Para ir além dos meus limites, um
relacionamento não pode me tolher a liberdade, a coragem ou a vontade.
Não procuro
um quadrado. Previsível. Demarcado. Com papeis definidos e repetitivos. Preciso
fazer todos os papeis da peça. Trocar de vilão para herói. Trocar de herói para
vítima. E depois, na hora dos aplausos, ser a cortina que fecha, para o suspense.
Para o próximo ato. Fazer isso a dois tem que ser mais divertido do que fazer
sozinha. Tem que ter mais nuances, mais complexidades. Tem que fazer diferença.
Não quero
ninguém ao meu lado como eu quero. Quero que haja surpresas, não porque
ignorasse, mas porque é múltiplo. Quero que me tire do conforto, não porque
dispense, mas porque é novo. Alguém que não abra mão de nada na sua vida. Nem de
ficar sozinho, se assim for necessário. Que não engula nada do que eu diga, mas
que ouça, reflita, digira. Alguém que me aguce a curiosidade para saber por que
as coisas não são como quero ou como espero.
Um relacionamento
tem que ser um espaço mais amplo do que a somatória de duas vidas. Tem que ser
elástico, sem regras rígidas, sem regras limitadoras, sem regras. Porque não há
motivo algum para buscar solidez num relacionamento. E sim, flexibilidade. Para
que os momentos tensos e difíceis da vida possam ali encontrar calor, encontrar
o abraço, o descanso para a atitude.
Traga-me o
café na cama apenas se assim quiser, não para me agradar ou conquistar. Não sou
um país para ser conquistado. Não sou um prêmio para ser ganho. Traga flores,
se quiser trazer flores. Ou não traga nada, se não quiser trazer nada. Não há como
ter paz num lugar de cobranças. Nem harmonia onde se instala o escambo. Quero poder
ser inspiradora de gestos inesperados e espontâneos.
Espero, sim,
do outro que negocie, regateie, dialogue. Que não se conforme com meu jeito de
ser, mas ao mesmo tempo, que não sofra com isso. Como viver com alguém que
sofra e se magoe com o que sou? Como acordar todo dia com alguém que se submeta
a mim? Como amar ao que morre aos meus pés?
Talvez não
seja fácil viver um relacionamento realmente verdadeiro, realmente intenso sem
tensão, sem esbarrar nas individualidades e nos padrões já estabelecidos. Um relacionamento
que consiga seguir em paz apesar das diferenças – outrora encantadoras – sem
transformar os pequenos quereres cotidianos e rotineiros em argamassas duras e
pontiagudas. Aliás, nada fácil a tarefa, constante e renovada antes de apagar
as luzes no final do dia, a tarefa de fazer da vida em comum um mundo bom para
se viver sem guerras.
Um mundo em
que não sejam precisos gritos ou brados para se fazer ouvir. Em que o perdão
não seja entendido como um jogo de certo e errado com lugares fixos. Em que a
alegria seja constante, ainda que haja discordâncias, ainda que haja dúvidas,
ainda que não seja consenso. E, sobretudo, que a verdade colorida ou dolorida
possa ser enfrentada, sem medo, sem truques; possa ser encarada, escancarada,
ouvida, aceita. Possa ser um remédio, e não veneno. Possa ser a cama onde
dormiremos toda noite. Em paz.
Esse mundo pode
existir. Basta acreditar. Pode haver magia e encantamento numa vida cotidiana. Onde
sonhar não seja uma brincadeira de criança. Ou que a criança seja uma faceta do
adulto. E se é possível nos relacionamentos de amizade sincera, por que não
seria nos amorosos? O problema não é querer assumir o controle sobre alguém, o
problema é não controlar essa vontade. Basta trocar o controle por confiança. Confiar
não é uma crença. É uma atitude.