quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Tudo passa

Porque tudo passa um dia. Tudo finda. Tudo morre. A vida que nasce está morrendo. E morrer é correr para uma direção sabida: onde não haverá mais mortes. Passa o tempo, passa a dor, as mágoas passam. Passa deixando vestígio ou não. Cicatrizes de ferimentos antigos deixados à mostra para nunca mais esquecer. Passa a tristeza de haver dor depois de ter acreditado na beleza. Acaba como tudo.

Difícil é entender para onde vai tudo que morre. E qual é o sentido de viver uma vida que finda, extenua. A flor vermelha balançando no galho pelo vento leve, a flor beijada pela abelha, ela também vai desaparecer. A abelha, o vento e o galho, tudo, tudo, tudo morre. Como a água que escorre no regato, e vai embora, batendo de pedra em pedra fazendo espuma. Como o pó da estrada que levanta e pousa nas folhas das árvores, ficando no ar um pouco.

Mas tudo acaba? O mundo não acaba. Acabam os homens, os dinossauros. O que é grande não acaba. O vento para, a brisa cessa, o mar vai e volta. As folhas verdes caem no outono amarelo. E o olhar fica à espera do olhar que se perdeu. O oceano acaba do outro lado da praia. O horizonte não acaba mesmo recortado por montanhas. Não acaba o amor.

O sorriso um dia também vai da boca que beijou e gostou do beijo. Vai embora o olhar que sorri e o gosto de doce na língua. O encanto gasta como fósforo que já acendeu. E o amor. O amor parece que não. É dessas grandezas que ficam porque é firme, e é firme sem nunca ter sido dura. Amor parece que é de outro mundo, de outra esfera. De um lugar que nada morre e permanece. Um lugar de sonho ou etéreo como o olhar.

Dá para beber dessa água sem nunca se enfastiar. Dá para beber do amor e nunca mais morrer. Porque é possível tanto quanto impossível. É acordar do sonho e continuar sonhando. O amor é a luz de um dia que não termina. O dia todo, meio-dia. Quente. Claro. Sorriso de dentes aparentes. O amor é o antídoto para a morte.

A vida que ama, não morre. Não passa. Só transcorre. Atravessa a estrada rumo ao impalpável e ao incorpóreo. E, se a alma não morre porque ama, também o corpo que ama não morrerá. Velejará no vento, subirá nas pedras, sofrerá as dores de haver neurônios por todo lado, mas não envelhecerá. O olhar de menina retornando no rosto faceiro de novo. O amor faz renascer e perpetuar. O verdadeiro amor.

E haverá falso amor? Haverá aquilo que atende por amor e não será? Um sentimento de pertencer ao outro sem medida? E que jorra ao chão frio sem ter resposta? Haverá outro amor menos sincero, menos simples, menos direto? Um amor elaborado por estratégias de conquistar e submisso aos prazeres intermitentes do possuir? E quem haveria de chamar de amor o que é justamente a falta de amor? Porque o amor pleno, total, verdadeiro, é todo ele liberdade, leveza, e lindo.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Por que te amo?

Por que te amo? E o amor, o que é? Por que a beleza? E por que você tão bela no seu sorriso amoroso? Por que a entrega? E por que acreditar em amor? Por que amar? E o que é amar? Deixe-me aqui no perdido da hora, lembrando de quando havia um vazio, havia um silêncio onde agora há essa música sem fim. Deixe-me aqui elucubrando na noite que se vai apenas por não saber respostas.

Enquanto o tempo deixa de existir, porque o amor é parecido com um relógio quebrado, não passa o tempo, enquanto a espera não é um peso, e o que espero é você, enquanto isso, vou amando a lembrança doce da sua pele apenas passando pela minha. E vou vivendo tudo como se fosse outra vez, e outra e outra. Como são os nossos dias e noites, cheios de vida.

O que, amor, é o amor? Cheio de calafrios e de arrepios desordenados, que atravessam os músculos como um raio. Que é, que é, amor? Essas coisas que percorrem o corpo, percorrem a memória, percorrem a alma até fundir tudo num só, eu, estátua que um artista esculpiu de haver você, a inspiração para tudo o mais. A vida que a arte não imita, ela mesma a arte de viver.

O que é isso que faz o sangue mais quente, e o olhar mais quente, e a música mais quente? Que provoca uma dança onde antes eram só pernas, que promove um balé onde antes eram só braços e corpos desconsertados e sozinhos. Vãos. Impuros como o beijo. Inócuos como olhos fechados. O que? Explique-me, você que me impacta só de existir, que me chama pelo nome mesmo antes de saber qual é.

Talvez haja um novo nome, um novo significado para o que já foi amor. Porque o que sei hoje, depois de ter amado tanto e me perdido em tanto amar, o que sei que preenche os espaços, os silêncios e os espaços entre os corpos distanciados, o que sei infinitamente que me faz pulsar e querer e sentir cada célula do corpo no movimento da sua cintura, isso é mais que amor. Porque amo amar você.

E no gesto improvável que é amar o amor, amo você tão simplesmente como há chuva depois do sol, ou há mar depois da montanha. Há a noite depois do beijo, e há gatos arranhando as portas, e há gosto depois de morrer nos braços, nos seus braços. Não, amor não é o nome. É outra coisa. É um gesto? É física, química, matemática, línguas? Que sonho, invenção de peça pregada fora do palco, um teatro de sombra e luz, qual o nome?

Não. Haverá um deus a inventar o nome para isso que sinto por você, já que inventou o sentir? Haverá uma palavra apenas para significar o modo como o seu olhar olha o meu, a quase prender-me o ar, levar-me a alma, queda livre sem paraquedas? Haverá uma única palavra que poderá dizer tudo o que tenho para dizer, que representa tudo que já foi dito antes e tudo que haverá por falar e cantar e sonhar e que é a única expressão em letra e som do que me faz na pele o simples lembrar você?

Então, que esse deus também invente um jeito para que isso que sinto se renove, se prolongue, se transmute a cada novo momento que passo e que passa, inteiro, poesia falada no vento, perdida e espalhada, que chega a todos os lados e todos os sentidos, poesia para ser proclamada como uma prece, sussurrada ao ouvido, tremor, amor.

Porque sinto e sei seu nome, veja, não vou ficar tentando entender ou explicar: vou apenas fazer de conta que é cedo e ainda temos a vida toda por seguir. Vou seguir sorrindo, amando – o nome indecifrável que não achei – o nome que é o seu! Vou caminhar ao lado, igual como não há iguais sobre a terra, simples como tudo que é diferente, vou caminhar apenas, olhando seus olhos que me olham. Sim. É amor.