terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Pode esperar amor eterno

 Pode esperar amor eterno, mas não que dure para sempre. Porque tudo passa, só o amor fica. O amor não é um sentimento, é o próprio espírito. E o espírito é livre por natureza. O espírito é a liberdade. Não haverá amor onde os laços se sobreponham ao correr solto, onde os abraços prendam mais do que apertem. Sobretudo, não haverá liberdade sem leveza. Onde há pressão, prisão, opressão pode até haver desejo, mas amor nenhum.

Então, me espere para se deitar e não feche os olhos antes de um abraço terno e fresco. No silêncio da noite, seu silêncio se unirá ao meu, profundo e único. E antes ainda, no olhar que não se desvia, iremos tocar a alma para fazer um sorriso brilhar no escuro. Não haverá o que temer porque não haverá o que defender.


No escuro e quieto desse encontro, seu nome, novamente entoado como um cântico, falarei até a exaustão, até que nossos corpos quedem sôfregos, clamando por uma brisa, um frio na pele, um arrepio morno, uma canção.


Ah, não tente desviar o momento para ampliar o prazer e fazer com que o tempo não pare, porque ele vai parar, como a respiração que se segura antes do mergulho. O tempo vai deixar de existir para só haver uma comunhão. Vou me perder em você para descobrir os meus sentidos, vou me aquietar nos seus sonhos para acordar das minhas ilusões. Tudo muito intenso, tudo muito rápido, tudo de uma vez. E haverá um dia seguinte? Haverá um amanhecer? Enquanto for noite e houver silêncio, e enquanto soprar o vento de hálito leve e fresco, enquanto sua mão segurar na minha para não se perder na escuridão, ninguém sentirá falta de luz.
Que tudo passa, mas não passa já.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Mudar não é fácil


Não é fácil mudar. Talvez por esse motivo sempre houve ritos de passagem. Toda transição é uma forma de trauma. Quando se é criança, acredita-se no fantástico. Amigos invisíveis, sorte, mágica. O sobrenatural para umas pessoas continua na vida delas em forma de superstições, comer isso, vestir aquilo, usar seu anel da sorte, ler horóscopo. Será que acreditar em deus é uma forma de crença no sobrenatural? Será que um dia, ao acordar uma pessoa vai rir-se de ter acreditado a vida toda nesse deus?

Hoje não há mais tempo para ritos. As mudanças acontecem a cru. Não há lugar para mentiras boazinhas, doçuras fingidas, palavras lindas para acobertar um possível feio, duro, áspero. Ilusões. Mas se for pensar bem, tudo na vida é ilusão. A própria Terra é uma ilusão de solidez de um núcleo de ferro líquido e em chamas. Em resposta a essa ilusão, um terremoto é um trauma. Quantos terremotos se tem que passar para aprender que a vida é a dança e não o salão? 

Mas a criança que nasce acreditando naquilo que não vê é menos sábia do que o adulto que só mede seu sucesso por aquilo que realiza? Crescer, mudar de um para outro, trocar os dogmas, passar a ter as próprias chaves, não precisa ser traumático, decerto. E nem tudo que se sabe quando pequeno deve ser perdido quando crescido. A lição errada é sempre uma coisa que enfraquece, rebaixa. Aquilo que remete ao alto, à clareza e alegria – todo o verdadeiro conhecimento traz alegria – essa é a verdadeira lição da vida. Tornar-se um adulto que acredita na magia, na beleza vazia, inútil, de uma paisagem, de um lago plácido, de um rio que cresce em corredeira, essa uma boa razão para viver.

A luz do sol é quente, a luz da lua é fria, a luz que irradia uma pessoa inconsciente dela mesma, generosa, no entanto, é morna como um abraço apertado. Tem pessoas que são especialmente calorosas na sua luz a ponto de iluminar mais do que o seu próprio caminho. Esse é o ponto do crescer que pode levar alegria sem grandes gestos, heroicos gestos, gestos teatrais. Crescer sem drama. Hoje as mudanças não têm tempo de ritos porque dispensaram as emoções conflitantes. A luz de cada um, seja uma vela ou uma lanterna, seja um holofote ou um farol, está dentro de um armário cuja chave está no bolso. Quantos já sabem disso?