Eu não gostava de gatos. Preferia cães. Cães pulam, alegres, mostram vivazes a sua estima. Gatos são quietos, observadores, parecem ranzinzas. Então, um dia, me apaixonei por um filhote persa, vermelho. Por alguns anos viveu ele em minha casa, com seu mau-humor e estranhezas. E então sumiu num carnaval. Sem camisa amarela. Sem deixar rastro. E aí, era tarde, eu já me acabava apaixonada derradeiramente por gatos. Sofri muito sua falta, mas passou.
Depois, ganhei outro gato persa, agora bege, meigo, carinhoso e muito relacional. Persas parecem não perder nada com aqueles grandes olhos vermelhos, têm aquela cara de mau-humor, mas é só cara. Leon, o gato, era rei absoluto na minha casa. Talvez porque acreditasse ser um cachorro, passeava entre os cães no quintal sem se vexar. Os latidos não o amedrontavam tanto quanto os passos de uma pessoa. E era de sua natureza diferente gostar de água, brincar com água, sentar na água com aqueles longos pelos finos. Andava comigo pelo quintal, nos bosques de árvores floridas, nas ervas perfumadas do quintal, passando por um cão. Eu falava com ele, ele respondia.
Animais entendem? Sim, entendem, só não sei o quê. Eles serão gente um dia? Ou já foram? Talvez sim, talvez não. Sei que não foram criados para nosso prazer. Não existem para nos satisfazer a existência. Não vivem para que possamos usá-los. Eles têm vida própria. Têm vontade própria. E têm sua própria consciência das coisas e de nós. Enchem a casa de alegria, mas não é para isso sua vida. É porque não sofrem como nós por nada. Brincam com qualquer coisa que puder fazer barulho, correr ou cair por suas patas, sem pensar em amanhã, em consequência, em sentido. Procurar sentido na vida é o que nos move. E, em alguns momentos, essa ação nos tira um pouco a alegria. Toma lugar o pesar, o sentir, o querer o que não há, o que não temos.
Eu tinha um gato ou ele me tinha? Eu cuidava de sua comida, sua água, suas pedrinhas, deixava-o dormir no sofá, beber água do chuveiro – por que gatos gostam de água morna? – mantinha sua vida calma, como ele gostava. E talvez eu fosse seu animal de estimação. A deixar que subisse na cama e dormisse aconchegado. Ele me tratava com carinho. Silencioso e cúmplice, me defendia nas noites, com seu olhar atento. E aceitava com volúpia a sardinha que lhe ofertava.
Então, sem me falar nada numa surpresa, de repente, dormiu à tarde no quintal de que tanto gostava. Dormiu para sempre, como sempre, calmamente. Eu quis chorar. Quis não crer. Quis mais uma vez aquilo que não tinha mais. Depois passou. Sua carinha linda ficará comigo, ficarão comigo suas doces lembranças. E assim, posso voltar a falar com ele, silenciosamente. Me espere, Leon, que um dia eu chego por aí.