terça-feira, 17 de novembro de 2009

Agora quero leveza

Agora quero leveza, a mesma leveza das nuvens que quando densas, descarregam-se em chuva pesada ou rápida, fina ou gelada. Quero ser a própria nuvem, passando e deixando no caminho apenas uma sombra deslizante pela superfície de tudo.

Ser como um olhar, sem tocar ou ser tocada. Ser como luz, ser a luz vibrante e colorida de um dia de sol na montanha. Sim, montanha porque elas guardam segredos, ainda assim. Porque segredos são pequenas surpresas que acontecem para fazer frente ao cotidiano.

Eu prefiro o frio da montanha ao morno dia que se arrasta sem sentido repetido e seco. O frio da montanha pelo menos traz cogumelos selvagens para serem colhidos por olhares atentos. E para paladares delicados. Cogumelos selvagens com gosto de queijo que minha memória vai eternamente me fazer lembrar de. Lembrar da alegria jovial de encontrar entre a palha do pinheiro aquela figura leve e etérea. Lembrar do tempo passado lentamente a procurar atenta algum vestígio, algum sinal de que haveria ali um gnomo escondido em seu chapéu. O vento frio e os galhos baixos das árvores fazendo do encontro casual um brilho no olhar.

E Deus. O reinado de Deus ensolarado e frio como os invernos devem ser. O Deus que faz a vida brotar da terra, brotar na pedra, brotar por nada. E que resplandece de braços abertos verdes com o perfume picante e doce dos pinheiros enfeitados. O amor sem preço e sem cobrança estendido a todos.

Sim, é possível viver a vida simples do tempo que passa gota a gota do riacho transparente, indo e indo e indo, não importa para onde, não importa quanto, não importa se. O viver incondicional das folhas que caem dos galhos soprados pelo vento. A vida pode ser cheia de mistérios tal qual o mistério dos regatos frios e murmurantes, cujos sons parecem repetir um mantra sem se deixar alterar pela correnteza.

Quando chove, como hoje, e é noite, fico ouvindo o som das centenas de milhares de gotas caindo e batendo sobre o telhado, inesperadamente nítido e mais intenso. O que posso fazer senão isso, ouvir e esperar, pois que é a lei da natureza que todo o peso das nuvens caia em desmaiadas gotas para que tudo volte a ser leve e fresco. A vida se renova na água que escoa, no verde que reluz, nos sapos que cantam. E eu esqueço o que vivi por tanto tempo prendendo a chuva, para brindar com cada gota que tilinta no telhado.

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