domingo, 22 de abril de 2012

Depois da Chuva


Depois da chuva, hoje abriu sol por trás das nuvens. Uma fresta de azul começou a se impor. Muita umidade, mas a claridade dá um ar mais bucólico ainda ao verde geral. Outono. É uma vibração contida, um colorido mal disfarçado, uma luz difusa. Momentos de silêncio real. Parece que a Terra parou de rodar, o vento parou de soprar, o movimento cessou. Vai estalar uma pinha lançando pinhão para todo lado, mas não agora. Um pássaro vai passar voando baixo por entre as copas das árvores, não, não ainda. Tudo parece meditar profundamente.

Meus pensamentos, no entanto, vão e voltam na eletricidade que não há em torno. O universo rodando aqui dentro, em segundos sem nenhuma conclusão. Nem a morte é uma conclusão. Nenhuma resposta pronta para minhas perguntas todas que chegam aos borbotões, chegam em tsunami, carregando tudo pelo caminho, tontas. Nada ficou no lugar. Só eu, sentada no ritmo de um coração suspenso, expectante de mim mesma. Contemplativa no gesto como um reflexo no espelho dágua, absurda por dentro como se a alma se recarregasse no relâmpago.

Procuro calma. Olho em todas as gavetas, reviro todos os armários. Toda calma tem uma alma guardada em si. E eu sou apenas alma irrefletida descalça e dispersa. Sonhando o vão do silêncio, cantando o mantra do retorno infinito.

Eu queria ser o infinito de todas as possibilidades não escolhidas. Tudo que sou, resultado de ter seguido esse e não aquele caminho. E se fosse outro? E se tomasse outra direção? Nada mudaria. Estaria aqui hoje no turbilhão de pensamentos soltos, jumping, num tipo de pensamento-bóia-cross, pensar-risco-de-vida, o que já é uma contradição em si.

Se eu cruzasse com cada uma de mim que não fui, em cada encruzilhada que escolhi, sentasse à mesa para falar da vida que levei e deixei de levar por não ter seguido ali e sim aqui, o que seria? Conversaria com os filhos que não tive, e que alimentei em detrimento de minha liberdade – fantasia de liberdade? A que distância estaria de onde estou hoje? E que resultados seriam a minha colheita a essa hora?

Não, não existe destino. Nada estava escrito antes. A única determinação foi um DNA me trazendo memórias que de outro modo não teria. O resto, o resto foi por minha conta. Aprendi mais? Escolhi o caminho mais fácil? Fui na onda? Voei sem direção? Podia ter aprendido piano, ter ficado no interior, nunca ter estudado, ou já ter me aposentado. Podia ter morrido num acidente de carro, ou ser nadadora profissional, ou ter morado na Bahia, ter vivido na chapada ou viver chapada. A cada momento, uma escolha define uma sinapse de quem sou na trama do universo. Eu sou o que sou. Não haveria outro jeito, outro caminho, outra escolha, senão a minha. Tudo certo.

E no silêncio que o dia fez hoje, minha mente despenteada continua reminiscente de se entender. Minha única missão: aprender. E teria aprendido se fosse dessa e não daquela maneira. Mesmo as pessoas por quem passei, não teriam sido outras, já que eu era aquela que fui e não outra também. Por esse motivo, hoje estou escrevendo sem ter que me preocupar com o lanche das crianças, de filhos que vêm visitar, ou de festas de aniversário para organizar. E sim, o sol despachou definitivamente a chuva para longe e para outro dia, talvez. No agora que posso contar, a claridade de fora ilumina o interior bagunçado. E por iluminar, sorrio. Esse era o meu destino aceitável, recriável, compartilhável. Então, rompo o silêncio geral e coloco minha música preferida. Afinal, posso viver a ilusão de pensar que escolho o que vou viver.

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