Gosto do
sorriso que me faz no rosto o lembrar. Simples. Delicioso. Leve. É ato
contínuo, como se fosse possível reviver o momento, o gesto. A verdade é que
revivo na pele o que a memória me traz. Quando é ruim, faz um movimento no
estômago, quase um soco. Quando é bom, faz um movimento no estômago, quase um
frio, um arrepio. E quando é bom demais ainda vem acompanhado de sorriso.
É bom
passar pela vida assim, sorrindo o que se viveu com prazer. Porque viver é mais
que isso, é mais que o prazer do contato, o prazer de experimentar junto. Mas não
tem coisa melhor para lembrar. Aquele momento pequeno, que passaria
despercebido de outra maneira, para outra pessoa, e que, no entanto, por voltar
em forma de corpo, um sorriso na boca, o olhar divertido, marca mais que
tatuagem. Fica mais que palavra escrita.
É que a
alegria faz o coração bater melhor, limpo, desenvolto. Faz o estômago trabalhar
com bom humor. Os pulmões explodirem cheios de ar. A pele melhorar. O olhar
brilhar. A alegria que pode vir de tantas formas, é ainda melhor quando vem
acompanhada. Ela aquece sem precisar acender o fogão à lenha. Alimenta sem precisar
cozinhar o pão. E enche de vida sem transbordar o copo. A alegria, ela mesma,
ela que vem com o pulsar do sangue de haver alma no corpo, de haver emoção no
toque de pele, essa alegria pode matar a fome, saciar a sede, acabar com a
guerra, fazer nascer flores no peito de quem tem medo.
Eu queria
poder derramar no copo de cada pessoa um pouco dessa alegria encantada de haver
encantamento ainda no século vinte e um. De saber que haverá sempre
encantamento possível para os que quiserem beber da confiança. Beber da
certeza. E haverá certeza nos corações das pessoas? Deverá haver pelo menos uma
certeza: o amor é uma realidade. Ele é o ar que esquenta com a aproximação dos
corpos. Ele é a água que escorre de uma emoção pungente, de uma beleza
estonteante, de um sentimento único, reconhecido.
Eu não sei
o que é felicidade, um estado eterno de emoção em alta. Não sei o que é acordar
todos os dias, todos os dias da vida vivida ou por viver, experimentando o que
é felicidade. Não sei o que significa uma emoção perene, um sentimento
inalterado, infinito, feliz. Não sei. Não sei o que é ter confiança na vida,
minuto a minuto, instante por instante. Eu não sei não ficar triste ainda. Não sei
ainda amar incondicionalmente. Mas sei o que é alegria fácil como a brisa do
mar nos cabelos soltos. A alegria leve e descontraída de quem dormiu bem,
metade a sonhar, e acordou para ver seu sonho de olhos abertos.
Nada dessa
alegria romântica, exaltada, deslumbrada que idolatra o outro e lhe veste de
tantas frases, de tantos gestos que, impossível se mover, faz sucumbir de
cansaço. O amor romântico que prende os dedos de mão em mão, com laços de
eternas promessas. Pesado demais para mim agora. Demasiado apertado para os
meus braços agora. Eu quero a liberdade de ser alegre por viver, por lembrar a
vida, por reviver cada minuto como um futuro a se realizar.
Posso ir
dormir todos os dias da vida que virá só de lembrar a ternura, só de sorrir de
novo pelo mesmo motivo, pela mesma emoção. E o que é isso senão amor? O amor
que foi soprado dos lábios de deus direto para nossas narinas sedentas. O amor
que é a alma do corpo, um corpo que aquece e revigora e se reconhece na
fogueira que queima. O amor delicado e doce da poesia que o sangue escreve
enquanto pulsa. Amor como chuva fina, silenciosa, mas que enfim molha, envolve,
enternece. É dessa roupa que me visto agora. Uma seda sutil trançada de
alegria. Não, não foi nenhum bicho que teceu essa seda, foi tecida do silêncio
de um olhar que permanece. E me acompanha.
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