Um sonho é um sonho é um sonho. Por um dia pensei que sonhos se realizassem. E melhor ainda, que sonhos não sonhados se realizassem. Só porque nesse dia acreditei em deus. Eu nunca tinha falado com ele, é verdade. Nunca tinha tido sequer um colóquio ao pé da cama. E eis que me encontro ao pé da cama em conversa paralela, sonhando com aquilo que apenas vislumbrei sem desejar, que me pareceu como uma promessa – de quem? Por quê? – e que era apenas uma nuvem desenhando formas num céu azul.
Eu amo o etéreo, senhor. Amo a forma que a nuvem faz no céu, uma brincadeira de elfos, do vento, todos que agem para o senhor. Todos filhos do mesmo senhor. Eu, que não falava com deus, não creio no mal, num mal que age pelas pessoas, ou que investe contra o que deus criou. Seria como acreditar que um filho não ama um pai, mesmo que não o conheça, mesmo que não seja o que gostaria que fosse.
O amor entre pessoas, o amor que completa, que investe, que liberta – ah, a liberdade de ser sem amarras, sem fronteiras – esse amor não tem outro sentido senão provar que deus existe. Existe pela transparência do olhar. Existe pela alegria da pele macia, do toque relaxado, da comida viva. O amor é um sonho que não precisa ser sonhado antes. Que não precisa de plano estratégico. Que não precisa ter sentido. Que sentido teria o amor? É para alguma finalidade, o amor? Não. Veio e volta a deus como o ar que respiro, como tudo que há. Como toda beleza, toda alegria.
Estou quase triste e a tristeza não é divina, bem sei. Ela é humana como as fraquezas próprias da carne. Humana e corrosiva. A tristeza é um mal que está aí para lembrar que deus existe. Quem mais para salvar da tristeza um coração que vislumbrou o clarão divino num olhar que passava? Sim, o olhar que passava era divino e capturou meu coração com seu anzol de carinho. Capturou-me, senhor, para quê? Apenas para satisfazer um capricho? Ou porque era para seguir acreditando como sempre, porque se deus existe numa fração de segundo de uma vida inteira então é porque ele sempre esteve lá, sempre estará.
Eu quero acreditar que a tristeza que me ocorre agora é apenas minha imaturidade querendo crescer, sair de casa, tornar-se autônoma, livre de mim. Pois que vá. Hoje eu quero apenas o que me dá alegria. Apenas o que pode ser inteiro, mesmo que ainda não seja. A promessa é um teste para a fé.
Eu quero viver a experiência direta de haver deus no universo só porque posso acordar e sonhar. Não vou desistir de sonhar, nem de me alegrar com todos os lugares comuns, cartões postais, que a janela aberta – já abri irreversivelmente – me traz. Mesmo à noite, mesmo sozinha na cama, ao pé da cama, na minha primeira conversa com deus. Se tudo vem dele, hoje estou voltando um pouco para seus braços que acolhe. Acolhe sim, e então sei que não estou sozinha.
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