Eu acredito mais no gesto do que na palavra. Mas acredito
mais no olhar do que no gesto. É uma necessidade mais que uma escolha. Ainda assim, o que de fato tenho escolhido
para minha vida? Um lugar para morar, pessoas para conviver, amores emocionados
e emocionantes. Quanta água desce no rio apenas porque há desnível. Quanta
mosca se batendo na janela acreditando que encontrou a saída. Aceitar. A vida
dá ou sou eu a encontrar? Atrás daquela montanha, numa clareira perfumada escondida
no meio da mata, tem ouro. E tantas promessas. Só é preciso superar a montanha.
Só isso.
No entanto, do alto de minha vida bem vivida não tinha sentido
nada assim antes. Grandes dramas, grandes amores, grandes sonhos irrealizados e
tantas realizações mal sonhadas. Desilusões do tamanho das expectativas.
Felicidades instantâneas, inenarráveis, inesquecíveis. Nada semelhante ao
sorriso alquímico capaz de transformar pedra cartesiana em maçã doce e
suculenta. De transformar em joia um coração brilhante. E continuar a ser
apenas um sorriso.
Dos significados da vida, apenas os enigmáticos, os
emblemáticos e os problemáticos me importam. Sim, porque as respostas me
apaixonam e passam. Enlevam como a maré. E depois voltam à praia, quebrando. A
mim importam os desafios dos olhares que se cruzam e se perdem. Os bilhetes
perdidos ao espetáculo imperdível. O momento de glória exatamente quando rompe
o cordão no peito numa corrida silenciosa entre emoções conflitantes.
Tal qual a chegada da chuva depois da estação seca, anseio
pelo momento em que, no cansaço da trilha tortuosa, possa descansar o olhar,
não no sol poente vermelho atrás das copas das árvores, não na calma da lua
crescente em meio aos prédios, nem sequer no mar lancinante e distante, preciso,
sim, encontrar um olhar sereno tão somente. Embora o medo.
Tenho medo da plenitude. De chegar ao fim da estrada. De atingir
o topo da montanha. O superlativo me dá medo. O absoluto. O fio da navalha. Os
cortes precisos me fazem estremecer. E o risco no escuro. O olho no olho. A
morte me dá medo por ser o absoluto da vida. A certeza me assusta, me faz dor de
estômago no meio da noite. A crueza polida da certeza improvável. Num gesto,
passo correndo a mão na vidraça baça do meu pensamento e desfaço os
significados ainda baforados pelo tempo.
Aonde quero chegar? Nem sei se tenho destino. Nem sei se
estou numa corrida que tem pista para ser seguida, linha de chegada e prêmio no
final. Alguém me contratou para andar em trilhos? Não sou uma locomotiva a
puxar vagões, mais pareço um motor de popa definindo a direção ao contrário.
Nas tardes sem chuva e azuis, ouço música que o vento traz e leva, um sussurro
impalpável apenas adivinhado. No mais,
só a vida correndo pelas veias porque nada em mim se dispõe a correr de novo.
De novo, o vento que nunca volta. (um canto de pássaro que passa voando atrai
meu olhar para o infinito que há em tudo).
Muito bom o texto, Fê! Sim, acreditamos no olhar! pati
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