No domingo de sol, saí para pescar. Lancei meu anzol da
dúvida pela janela da casa iluminada. A luz, embora por todo lado, me
obscurecia o olhar. Será? Será, meu deus? E assim, na expectativa do que viria,
fiquei ali aguardando passar um peixe grande que me aliviasse o peito. Um sim me faria feliz. Um talvez me deixaria alegre. E um não? Não, não suporto nãos. Uma dificuldade
anímica para aceitar o adverso. Uma reação de criança. Um mundo inteiro e eu
quero o que não pode?
Para acompanhar a manhã de sol e nuvem, o som rouco e inebriante
de tom waits. Fico olhando fixamente para o nada. Tudo o que não existe é um
vazio. E o olhar perdido volta-se para dentro. Porque o tempo é uma invenção. O
futuro é uma ilusão. E o próximo segundo já aconteceu. A linha balançou um
pouco na brisa fresca e me animou. Mas a dúvida ali ainda.
Eu tive uma gata guerreira. Novinha já ensinava os outros a
subir no telhado. Novinha se foi de mim. O não
ali, me apalpando. Olho pela janela, azul de céu e verde de montanha. Borboletas
nas paredes caiadas e risadas ao longe. Dá para se divertir à toa, à toa, como
as andorinhas. Dá para se esquecer da vida ao se esquecer de si, só olhando,
olhando. E a vida é o que, afinal? Ao olhar, a vida vai passando, gota a gota.
Uma fisgada no anzol. Uma pressão na mão. E meu peito se
anima de novo. É bom sentir o frio que a brisa faz ao passar pela camisa e
atingir a pele. O sol atrás da nuvem. O dia que se perde escorrendo como
sorvete na mão quente. E eu na dança do meio dia sem fazer sombra, sem deixar
marcas, apenas esperando o momento preciso de puxar a linha.
Eu nunca sei. Nunca sei o momento de nada. De decidir ir ou
ficar, ou outra coisa ainda. E tudo que há é esse saber, o resto é o coquinho
descendo a ladeira, a água correndo para o mar, e o infinito a esmo sobrando
por todo lado. Uma parte de mim gostaria de ser assim, uma reunião de acasos
desconexos e soltos perambulando pelas ruas. Mas a outra parte, sempre há outra
porção em linha de choque, rompe o silêncio e fala o que quer. Quem fala o que
quer tem que estar preparado para o que vier. E, desde então, de assumir os
riscos.
Hoje, no augúrio de sentir que nem tudo é como a vida quer,
lancei meu anzol da dúvida. Por que penso tanto, meu deus? Porque tenho
neurônios e córtex cerebral, simples assim. É da minha natureza questionar a
pedra que cai e a folha que balança. Mesmo tendo aprendido a rir como um regato
da pedra que cai e da folha que balança, e rir à toa também. É que ainda tenho
que aprender a pensar leve. Pensar demais leva o anzol para o fundo e nada se
pesca. A dúvida permanece.
Nas entrelinhas, observo a palavra que me sopra o vento. Ela
martela no meu peito e encontra um lugar para passar. Eu sou o som, o verbo e o
deus a soprar. Procuro respostas nas ondas do mar, nas curvas das colinas, no
branco das nuvens. Minha vida é uma coleção de latas e de respostas sobrepostas
em camadas. Coloridas, molhadas, penduradas em anzóis lançados pela janela. O sonho
e a vida. Onde uma, onde o outro? Às vezes, para saber que vivo, eu lanço
pedras no lugar do anzol. E mergulho no sem fim do fundo do fundo de tudo. Quando
o sonho brota na parede úmida, brota nos muros e flore despreocupado na pele,
então sei que alguma coisa foi fisgada. Aí, vou para casa.
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