Eu já disse
Eu
te amo a diversas pessoas, diversas vezes, algumas repetidamente,
outras nem tanto. “Eu sei que vou te amar por toda minha vida” foi um
sentimento que permeou todos meus encontros, com todas as pessoas com quem vivi
ou compartilhei afeto. Foram pessoas que se sucederam nos meus dias, ou eu nos
delas, como se fossem únicas, absolutas, ímpares – e assim, talvez, tivessem
sido naquele momento. Não havia falsidade nessa expressão, ao contrário, havia
muita sinceridade, havia inclusive o desejo de que isso se realizasse. Antes de
ser uma declaração de amor, era uma oração ao universo, para que aquela
felicidade momentânea perdurasse ao infinito, até o fim das nossas vidas.
E, embora
algumas dessas pessoas não tenham permanecido mais que alguns meses, outras
anos indecifráveis (terão sido felizes todos?), a simples lembrança delas hoje
mostra sua importância – e que tenham sido importantes por sua dureza, sua
tristeza, ou pelo colorido dos dias, não diminui a importância ainda assim – a
simples referência de terem passado pelos meus braços, ou por eles se
lamentarem por isso, são marcas do que o amor traz, constrói, transforma.
Talvez seja
muito romantismo de minha parte acreditar que o amor seja tudo, absolutamente
tudo, de que precisa uma pessoa para viver sua vida em paz, feliz, em harmonia,
com crescimento (nessa última parte incluo o que não está explicito, mas que
promove crescimento: dores, discussões, divergências, tempos diferentes,
hormônios, e uma gama de outros sentimentos tais como medo, insegurança,
orgulho, vaidade, e que tornam a vida compartilhada tão dinâmica e diversa).
Mas mesmo os amigos queridos precisam ouvir Eu te amo de vez em
quando. E atualmente até mesmo as relações profissionais carecem dessas
declarações e aceitam demonstrações com prazer.
Mas já
acreditei piamente que amar fosse um verbo intransitivo, bastando apenas que eu
amasse para sentir-me plena, feliz, fluída. Que o amor platônico fosse tão bom
e tão significativo que dispensasse declarações faladas ou expressas. De que
bastava tão somente a visão do ser amado, observá-lo em seu dia, sua
normalidade cotidiana, no seu gesto simples, espontâneo, para que me sentisse
um ser especial, amado por deus.
Isso foi há
muito tempo. No tempo em que eu não havia experimentado ainda o contato dos
lábios que se desejam, do olhar que penetra. No tempo em que eu não sabia o que
era sofrer por amor. Em que não entendia ainda o que era esperar em vão por um
sinal, qualquer sinal, de reconhecimento. Num tempo anterior de eu descobrir no
corpo o que uma presença causava, e de como sua ausência doía. Antes de
perceber no peito que amar é um verbo complexo demais para ser conjugado apenas
na primeira pessoa.
Hoje sei
que não foi em vão nenhum desses Eu te amo que expressei e expresso.
Porque entendo ser o amor como é – fogo - precisar de mais dele para ser. O
fogo se alimenta do fogo como o amor se sustenta no amor. Não há como viver o
amor sem cantá-lo. E não há como ser amor sem o colorido de todas as cores que puder
haver. O amor se vive de corpo inteiro, em todos os sentidos, até naqueles
surreais como imaginação, como o sonhar.
Além do
mais, algumas dessas pessoas apenas passaram pela minha vida para,
amorosamente, me permitirem que transpusesse a margem, para que eu saísse de um
relacionamento definhado e sem forças, ou para que ambas pudéssemos nos atirar
ao desconhecido, em detrimento do medo ou da insegurança que nos oprimia. E,
pelo desejo de manter algo que nos libertou, cremos na continuidade de algo que
teve o propósito apenas de ser passageiro, de ser uma ponte, de ser uma
companhia na estrada das mutações. Às vezes, a presença de alguém na nossa vida
pode ser tão somente uma vibração para o próximo passo. Mais nada que isso. E,
se é difícil entender, é difícil deixar ir.
Por que não
é só a parte do Eu te amo que cria um constrangimento na hora de olhar-se ao
espelho e ver-se naquela estranha posição de acreditar mais uma vez nessa
emoção. Tem a outra, quase mentirosa, quase apenas sedutora, que é o para
sempre. Quanto tempo durou meu último para sempre? Mas sei que isso
é possível porque vejo muitas pessoas vivendo nesse gerúndio. E que, sim, para
sempre pode ser muito feliz. Eu vejo esses exemplos e deduzo que não é
uma imaginação, uma ilusão, um sonho. Um relacionamento pode ser continuamente
reconfortante e ao mesmo tempo desafiante, inspirador e terno, pode ser uma
noite de dormir de conchinha e outra de espalhado pela sala.
Olhando
agora pela janela, para a lua que se depreende atrás das nuvens, ouvindo o
vento passando pelas folhas das árvores, no tempo que é só meu, que não preciso
dividi-lo com mais ninguém, no infinito das horas que uma vida é, penso em que
sono calmo ou luxúria você se encontra enquanto estou acordada. Nesse momento
em que reconheço a presença do amor também nos desencontros, como o silêncio faz
parte da música, é que entendo que o amor é o tempo que passa.
Muito bom Fê!... Muito bom.
ResponderExcluir