Tem dia que eu queria me exilar do mundo. Da vida. Ficar
olhando o azul do céu como se ele fosse apenas azul do céu. Nada a ver comigo.
Nada a ver com nada. Sonhar com nuvens. Ou nem sonhar absolutamente. Ficar
impassível diante de tudo, não achar lindo, nem me emocionar, nem pensar, ou
sentir. Ser como a rocha. A montanha. A água que corre no rio.
São dias que a vida faz parecer que tudo é muito, é demais.
Um peso. O vento move os fios dos cabelos. As flores caem dos galhos. Pássaros
voam ou cantam nas árvores. Tudo igual. E tudo muito além do que posso
suportar. Uma nuvem me salvaria. Uma única nuvem se transformando no céu.
São dias de silêncio intenso. Como um gole de cachaça pela
manhã, antes do café. Em que o meu nome não significa nada. Nem o verde inúmero
da paisagem. Nem o cheiro de fumaça que exala da chaminé. Tudo que se movimenta
está alheio a mim. Um sol fazendo sombra por trás. Eu queria apenas não ser.
A existência é algo difícil às vezes. Quais são os dilemas
das árvores enormes e climáticas das florestas? Com o que se emociona um
pássaro no seu interior? O que significam as janelas abertas de um casebre
voltado para o mato? Apenas meu tino em desatino pensa nisso. Apenas meu
cérebro incansável passeia por tudo. E hoje esse cansaço.
A vida por levar é apenas fruto de minhas decisões. Como a
sombra que não existe sem luz. E tem dia que não queria entender nada, não
saber de nada, não escolher nada. Ser menos complexa na vitalidade que me dá
tônus, que me estimula. Ser uma só coisa, uma só saída, uma só direção.
Tem dia que não queria ser deus. Não queria criar nada. Não
me criar em nada. Apenas vicejar na vida que passa. Para onde? Para que? Sem
sentido. Sem porque. Ficar invisível. Totalmente invisível. Não fazer
diferença. E acima de tudo, não pensar
sobre isso. Não concluir nada. Nada. Pessoissimamente.
Ao invés, numa peça que me prega o destino, hoje sinto tudo
em dobro, no máximo, no limite. Extrapolo o horizonte, explodo o peito além do
fôlego, além das batidas descabidas do coração. Tudo numa intensidade muda. Jorrando
como seria o sangue se não corresse em veias. A pele capturando tudo, o cheiro
de tudo. O universo passeia por meus olhos em segundos. Para onde vou? Para
onde quero ir?
Sem esperar respostas, viro a página para o pôr do sol.
Quero ter a alegre inocência dos que nasceram ontem, perplexos e espantados com
tudo, sem entender ou querer entender, sem precisar senão de um peito que os
alimente. Quero o caminho do meio. Simples. Dar a mão ao balão de ar colorido
que sobe sem pensar, balançando.
Nesses dias de muitos sabores e aromas, de um cardápio de
cores sem tamanho, de um tapete de arabescos infinitos, nesses dias eles mesmos
cheios de ar e luz, eu queria ser apenas a criança que há ainda. Distraída,
descuidada, brincando com a formiga, um pouco de areia, concentrada.
Imperturbável no meu sonho de viver. Hoje, num tempo sem clima e sem estação, eu
queria apenas não querer. Mas dá para viver sem querer?
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