Me desculpe. Tenho certa incompetência em falar o que
realmente importa. O que realmente me importa. Olho para o lado, fico sem
jeito, falo do tempo, morro de medo, desconverso. Depois, desato numa conversa
sem fim sobre valores humanos, parece que as pessoas deixaram de acreditar na
vida, na beleza da vida, na alegria descompromissada e leve que pode ser a
vida. Reflito sobre a mudança de rumo, revisões, reposicionamentos, sobre o
pensar diferentemente. Às vezes, falto com a verdade. Com a verdade do que
precisava dizer, e não digo. Ou não precisava dizer, mas queria. Nada é
impossível. Só o desejo é inalcançável e previsível. Sempre por realizar,
sempre à frente do momento. O desejo que interrompe o rio, o riso, o curso natural da brisa. Foi um quase. Foi só o risco despontando na
superfície para então já escorregar reticente. Queria apenas dizer o que sinto.
O mais difícil.
Sinto muito. Sinto tudo impossivelmente ao mesmo tempo
agora. Sinto intensamente. Pareço menor do que sou, tal o tamanho do mundo. Criança
perdida numa feira de rua atônita não encontrando as pernas da mãe que se
descuidou. E de sentir tudo e tanto, perdi-me dentro de mim. Calabouços, cavernas
incrustradas de pedras e frio e escuro, labirintos de sentimentos desconexos,
mapa sem norte. Todos os caminhos do mundo perfazem minhas veias, minha pele de
toque, despencando vertiginosamente como cachoeira de sentidos. Hoje, ao me
resgatar, debruço-me à beira, no vazio profuso de haver um além entre o pensar
e o sentir. Debruço sobre todos os julgamentos do que penso sentir e do que
sinto sem saber. Piso a estrada com a força de quem entende o que faz, mas faz
sem pensar. Arrasto no meu andar raiz um bocado das pedras do caminho. Assim,
vou levando na retina os espinhos despercebidos de estar descalça. Grata de ser
quem me descubro a cada clareira.
Muito obrigada. Muitíssimo obrigada por me aceitar sem eu
conseguir me explicar, e, em me explicando, complicar mais do que esclarecer. Muito
obrigada por me deixar fluir sem medo e sem culpa, por abrir o peito e o
coração e a alma numa exposição sem limites e sem pudor. Por me deixar tomar
pela beleza, pela beleza até onde não há beleza, porque o olhar é o sujeito da
oração, e vê o que quer, o que não quer, o que nem sabia que haveria. Obrigadíssima
por me ouvir, sobretudo os meus silêncios infinitos, as minhas dores
insolúveis, as minhas dúvidas onde expresso puro consenso, puro consentimento,
pura presença. E eu me apresento no sorriso alegre de frases inteligentes, e me
apresento na distância impassível de um gesto. A alegria é o sol do meu dia, há
dias e dias sem chover. Muito obrigada pela generosidade em tentar me entender,
eu que não me entendo, que falo alto quando queria cantar, murmuro quando
precisava gritar, e me descabelo quando o que faria era derreter. Muito muito obrigada
porque o dia se abre no meu peito a cada momento que encontro você.
Te amo.
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