quarta-feira, 9 de junho de 2010

A vida é um conjunto

A vida é um conjunto de alegrias e tristezas que se revesam e se sucedem. Quisera viver somente as alegrias, o lado claro da vida. Olhar pela janela transparente da confiança, estender a mão para a fruta sempre disponível, sempre ao alcance. Quisera sentir somente o amor, amor que sinto, que me toca. Mas ao dia segue a noite. Bela quando há lua, bela quando não há. Cheia de estrelas, mas nem sempre. O sempre é uma coisa que não existe na vida.
Ainda assim, amo a vida. Amo passar o frio das manhãs geladas de inverno. Elas são límpidas, azuis, bordadas de verde da serra. O frio que aconchega porque é a vida que escolhi. Depois nasce o sol, e ele vai esquentando aos poucos, aos poucos fazendo sombra por onde vou. Não é o sol que faz sombra, sou eu. Sou eu que sou sólida e opaca, seguro um pouco a luz de passar. A gente que não é luz quer sempre carregá-la conosco. Então, fazemos sombra. Quisera não fazer sombra sobre ninguém. Pisar nela com o sol sobre minha cabeça. Mas projeto por onde ando a sombra do peso que meu corpo tem. Que minhas experiências trazem.
Como é complexo viver. Quero luz e faço sombra, quero alegria e trago as dores de outros tempos nos músculos e maxilares travados. Busco a paz, o significado, o abraço quente. E levo também a balbúrdia barulhenta dos desencontros, a incompreensão das falas desconexas, o balançar vesgo dos braços a esmo.
Queria apenas ser uma dentre tantas que sou. Vestir a roupa simples de um dia e ser eu mesma sem enfeites. Falar de amor e ver a reciprocidade do mundo no alô das mãos que acenam. E sorriem. E se dão.
Já consegui juntar muitos significados para minha vida. Ter me achado um dia no lugar da vida que escolhi foi um belo significado. O primeiro dos muitos passos que se faz a caminhada da vida. Mas quanto tempo, meu deus, para dar esse passo. Quanto tempo para entender o que queriam dizer minhas pernas, entender que direção tomavam meus pés, meu olhar desencontrado do resto, olhando para as nuvens, o sonho.
Viver é melhor que sonhar, sem dúvida. No sonho tudo dá certo. Você vai crescer e vai se dar bem. Vai encontrar alguém que te ame como você o ama e vai se dar bem. Vai trabalhar naquilo que gosta e vai se dar bem. Tudo vai dar bem. Magicamente. Lindamente. Mas viver tem surpresas, tem o inesperado. Tem aquilo que nem o sonho te daria: o fascínio e o medo do novo.
O novo é uma regalia para poucos. Que bom poder reconhecer a cada momento a novidade da paisagem. Uma flor que abriu, um galho que caiu, um olhar forte que se sustenta. Isso faz toda a dor antiga e grudada em você pelas solas dos pés parecer que são cócegas. A vida e a complexidade dela. E eu que pensava que melhor para mim era buscar o simples. Onde o simples? Só se for pela janela fechada e transparente que permite ver o lá fora sem se expor. Sem sentir o vento frio. Só se for para não sentir o arrepio que o frio faz na pele, como a alegria faz na pele, como uma boa lembrança faz no couro cabeludo.
Sim, o vai e vem da vida. Não é fácil entender os motivos. Não é fácil buscar paciência sem deixar de pensar que é filho de deus, que é o filho de deus. O escolhido. Sem pensar que o mundo gira em torno de si.
Bom viver com todas as diferenças. Todas as dificuldades. Todas as desavenças. Porque o melhor de tudo é o que se leva dela. O sentido que só sentindo se tem. Que bom que é viver.

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